quinta-feira, 26 de março de 2009

violência invisível

Estava andando, leve e distraída, quando uma mulher em sentindo oposto caminhava na minha direção. Não a notei, ela sim havia percebido minha presença incomoda naquele inicio de tarde. Eu pensava onde ia almoçar, não tava afim de preparar nada e decidi que iria comprar uma salada e come-la em casa. No intermédio dos meus anseios, meus passos largos, a roupa casualmente fresca, se não fosse um pequeno furo na minha blusa (imperceptível), meus óculos escuros e cabelos rabo-de-cavalo, denunciavam uma pseudo representante da burguesia do bairro da Liberdade, em São Paulo. A outra, vinha sorrateira, sem alarde, na minha reta, pensando tudo, menos no futuro. Senti um choque nas costas, acompanhado de uma dor surpreendente. Paralisei por meio segundo e avistei aquela mulher de andar firme, mais ou menos da minha idade, antes invisível, com uma aparência de maloqueira (termo usado em são Paulo para designar moradores de rua), cabelos crespos e curtos, corpuda, de veste preta e surrada, sumindo entre os pedestres. Ela passou por mim, socou minha lombar falando algo que não entendi, e continuou sua trajetória sem olhar para trás, deixando de verificar o dano causado e a reação da sua vitima aleatória. Num súbito momento insano me preparei para correr atrás dela. Que loucura! Pegar uma guria dessas, seria como correr atrás de uma violenta surra ou coisa pior. Parei, respirei, ninguém viu aquilo, nem uma alma pra me consolar dizendo: calma, ela sempre faz isso, e é perigosa, ainda bem que você ficou quieta.
Continuei meu percurso atordoada e, agora, atenta. Todos que passavam na minha frente e atrás, se transformaram em agressores em potencial. Fechei meu punho e segui adiante. Uma lágrima furtiva caiu. Me sentia humilhada, brutalmente violentada. Nunca apanhei na vida, nem dos meus pais, quiçá as chineladas da minha mãe, que só me faziam rir de tão inofensivas, e as brigas com meus irmãos, que também não contam. Comecei a compreender, que na verdade, a maloqueira não bateu na Patrícia, pois não a conhecia, se tivesse oportunidade, talvez não o fizesse. Na verdade, aquela alma perdida atacava a sociedade boçal que a ignorava. Sabe lá o que passou na cabeça dela. Geralmente quem bate apanha, ou já apanhou. Fui o alvo perfeito, um ser (talvez pra ela) incapaz de uma reação a altura. Tão logo, me senti importante, julgada em alguma instancia por aquela pessoa infeliz. Espero profundamente, não encontra-la mais. A probabilidade existe, já que faço o mesmo trajeto todos os dias, em horários diferentes. Quem sabe já tivessemos nos cruzado?!Não vi seu rosto, não tenho como reconhece-lo. Seu ato feroz ficará gravado em mim, com um arroxeado em minha pele, que logo sumirá, e a lembrança de uma violência gratuita, menos grave do que essas que ouvimos falar todos os dias nos noticiários. Me senti vítima e algoz de uma sociedade que anda sem notar os indivíduos invisíveis. Eles procuram ser vistos e se expressam da sua maneira, reproduzindo seus delírios.

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